segunda-feira, 29 de março de 2010

Evoé, Pagú, Evoé.


Musa do modernismo e militante de causas sociais, Patrícia Galvão conquistou espaço na memória política e cultural do Brasil

A biografia de Patrícia Rehder Galvão, a Pagu, causa encanto em leitores e estudiosos pela sua intensidade. Desde o dia em que se entendeu por gente, nos seus 52 anos de vida, impôs a si mesma o dever de mudar o mundo. E não poupou esforços para isso. Foi ousada, corajosa, moderna e, sobretudo, humanista, desde antes de acertar o foco social e político de suas lutas. Mas, depois disso, enveredou por um caminho que jamais teria volta. "[Pagu] Procurava pessoas e causas autênticas", afirma o professor K. David Jackson, da Universidade de Yale, especialista em literatura de língua portuguesa e, sobretudo, na obra da militante e artista brasileira, no prefácio do livro Paixão Pagu - A Autobiografia Precoce de Patrícia Galvão (Editora Agir, 2005). "Aquela que encontrou primeiro, inesperadamente, foi a questão social e o ativismo político, mas demorou para sentir um interesse vital. Tampouco achava interessante no começo a política radical." A mudança de opinião se deu após ter passado alguns dias com o líder comunista Luís Carlos Prestes (veja boxe Passagens da Vida Privada). O encontro aconteceu em 1931, em Montevidéu, no Uruguai, e a ligação com o Partido Comunista durou sete anos. "A pureza do caminho de Patrícia logo se mostrou incompatível com a ação partidária que escolhera", explica Jackson, em Paixão Pagu. "Ia acabar sendo expulsa [do patido] em 1938, mas não antes de tentar provar a sua proletarização, inclusive com o romance Parque Industrial, de 1931. Ninguém ainda havia feito literatura nesse gênero." A obra é considerada um dos pontos altos da trajetória de Pagu e, por exigência do Partido Comunista, saiu sob o pseudônimo de Mara Lobo. "Nesse romance proletário, ela coloca suas idéias a favor de um povo sofrido e combate uma burguesia intolerante e inconsciente", diz a jornalista e crítica literária Leda Rita Cintra, curadora de Pagu, Vida e Paixão, evento em homenagem à autora que segue em cartaz até 16 de julho, no Sesc Santana (veja boxe Álbum de Fotos).







Completude
Pagu nasceu em 1910, em São João da Boa Vista, interior de São Paulo, mas passou a infância no Brás, bairro da região central paulistana. Na adolescência já chamava a atenção por sua personalidade forte. Poucos anos mais tarde, levada pelo poeta Raul Bopp, Pagu aproximou-se do grupo de intelectuais paulistanos que encabeçaram o movimento modernista brasileiro. Foi quando teve o primeiro contato com a pintora Tarsila do Amaral e o escritor Oswald de Andrade (veja boxe Passagens da Vida Privada). Sua luta contra a ditadura de Getúlio Vargas, iniciada na década de 30 quando tinha apenas 21 anos, foi dura e tortuosa, pontuada por prisões - mais de 20 - e torturas. "Ela sempre sonhou entregar-se totalmente, sem limites, até a aniquilação, ao amor, a uma causa, à vida e até à própria morte", afirma a professora Lúcia Maria Teixeira Furlani, autora de Pagu - Livre na Imaginação, no Espaço e no Tempo (Editora Unisanta, 5ª edição, 1999). "Procurava, freneticamente, o que lhe faltava, a completude que todos perdemos e pela qual ansiamos, esse era seu traço mais marcante. Além de seu olhar sensível, antecipatório e antenado na cultura, na política e no comportamento", ressalta a professora, estudiosa do tema há 18 anos.



Apesar de marcante, a atividade política não foi a única causa de Pagu. Não é possível dissociar sua vida da importância que teve para as artes e a cultura, por exemplo. "Ela foi jornalista, crítica de letras, artes, televisão e teatro, poeta-desenhista, romancista, incentivadora cultural, mulher precursora e revolucionária", lista Lúcia Maria. "Soube também ser dissidente política, quando rompe com o Partido Comunista e volta a ser apenas Patrícia, defendendo um socialismo libertário, pacífico, democrático e espiritualista." Para Geraldo Galvão Ferraz, filho do segundo casamento de Pagu, ela foi, sobretudo, alguém com uma vida que fez diferença. "Desde o exemplo de rebeldia e irreverência da adolescência ao engajamento no tempo modernista para, em seguida, começar seu envolvimento político. E, enfim, no importante papel de divulgadora das vanguardas estéticas dos anos 40 e 50." Para Leda Rita Cintra, curadora do evento do Sesc, sua maior importância cultural - "que permanece até hoje", ressalta - foi a apresentação ao Brasil de nomes como o do autor espanhol Fernando Arrabal. "Ela o traduziu e o colocou em cena pela primeira vez no país, com a peça Fando e Lis." Outras participações fundamentais se deram nos jornais O Homem do Povo e A Mulher do Povo, criados em 1931 por Pagu e seu primeiro marido, o escritor Oswald de Andrade. "Naquele contexto, representaram uma rebeldia política máxima contra o governo de Getúlio Vargas", afirma Leda.



E ainda havia a maternidade. Com o primeiro filho, Rudá de Andrade, do casamento com Oswald, teve uma relação que durante muito tempo foi conturbada pela militância política. Com o segundo, Geraldo Galvão Ferraz, da união com o jornalista Geraldo Ferraz, foi uma mãe presente, de acordo com ele próprio. "Minha mãe era um tanto superprotetora, mas também muito carinhosa. Era uma mãe como qualquer outra, apenas com horários diferentes dos das mães dos meus amigos. Ela trabalhava bastante em casa, sempre na máquina de escrever. Mas sabia tirar seu tempo para uma brincadeira comigo, para um gim-tônica e um cigarro", lembra ele

saiba mais
www.pagu.com.br

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